derrames de esquinas distintas

o silêncio do meu próprio corpo derrete-me a alma, este desassossego de quer ser tão intocável, de quem quer ter o que tinha sem sofrer as consequências do tempo, dos dias. enganei-me, quis ser aquilo que o meu padrão me pede, quis ser imune as consequências dos meios que nunca justificariam o fim. e quis morrer de amores em esquinas diferentes, quis que um deles me levasse ao nirvana inatingível e me conservasse tóxica no apogeu daquele orgasmo. quis que uma dessas esquinas me engolisse, me amasse desse modo que só eu entendo, de um modo imensamente carnal mas que nada acrescenta à minha viagem interior. e quis que essa relação de esquina se mantivesse saudável, que amar assim me mantivesse doente de tão apaixonada. mas o amor morreu, morreu longe, numas quantas esquinas à frente, morreu de frio por andar nu na rua, em correrias desenfreadas sobre uma chuva gelada de um inverno violento. e a minha crença em amores de esquina, amores de caixão-à-cova morreu-me por se amar demais, porque já não sabia viver sem si mesma, morreu porque morrer faz parte da amar, porque só os amores imperfeitos podem ser amados, só aqueles que se amam ao longe, observando-se discretamente em esquinas distintas, só esses se podem amar verdadeiramente, sem palavras, sem silêncios, sem nada que os pudesse destruir, permanecendo ao longo dos anos imortais, porque por estarem tão longe, conseguiam amar-se tão perto.

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