derrames daquilo que fomos

Quero dizer-te que sou mentira, que a calma e tranquilidade que te transmito é pura ilusão da pouca paixão que me tens e que rapidamente se desvanecerá. Tudo em mim são raivas e ódios dos outros e de tantos como eu, tudo por cá são paixões e desejos por realizar. Sofro e esperneio toda a minha cede de tudo viver, tudo quero mas nada procuro, tudo o que eu sou para ti é tudo aquilo que odeio em mim. Quero que saibas que toda a paixão que procurava se tornou raiva e fogo no meu corpo, todo o ódio que carrego de mim são amores pelos outros, aqueles que soam sempre tão perfeitos aos meus olhos chorosos de puta ordinária. Sim, tudo o que quero é ainda carne e fogo e o adormecer do ser, a paixão do arrancar das roupas com a alma a cair no chão aos pedaços. Tudo o que sou para ti são cacos de algo que já não existe sem ser aí, nada de mim sem ser raiva aqui pulsa, tudo o que fui de doce e de amor está em ti, e o resto sou eu.
Sem ti sou só este caco meu, mutilado e morto, que apenas come e não fica cheio, vomita e não enjoa. Tudo em mim é aquilo que odeias nos outros, é sangue e lágrimas de dores que são minhas e que tu não percebes, dores que não estão nas tuas obrigações perceber.
Oh como gostava de amar essa calma que és, essa raiva que não me tens, esse carinho sem tesão que a mim não me diz nada mesmo quando me dizes tanto, tanto daquilo que quero ouvir. Mas andas enganado, achas que as noites passam e o sentimento não muda, que o frio não fica e tu aqueces, esqueces que o miocardio se cansa de andar apaixonado e não ser aquecido de volta, se cansa de ser sempre novo demais para ser amado, desconsiderado por tudo o que tão padrões sociais ou pessoais. E eu canso-me com ele, e juntos ficamos, desgastados, a ver-te esperar por mim, esperar que cresça e mude, quando tudo o que quero é que o tempo passe e cure, que o tempo nada mude, tudo porque me encontro agora a ser tudo aquilo com que sonhei mas sangrado, com feridas que não fecham. Quero que me venhas lambê-las e amá-las como cão que és, quero que venhas deitar te comigo e despir-me as roupas, tudo o que quero é paixão, de ti desejo, e depois do rasgar das vestes, de gemer de prazeres que não findam, que venha o amor. Depois da paixão que te peço, que venha o amor que é tudo o que és, e podemos deitar-nos e apenas adormecer.

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