amor é crença

- porque deixaste de cá vir? de apanhar o mesmo autocarro todas as sextas?
- porque a minha frieza tornou-se volátil entre os teus lábios grossos e novos. por vezes, nua na tua cama vazia de todas elas, eu sentia-me vulnerável, não por saber que os teus ouvidos se enchiam de orgasmos alheios (porque eu sei que não), mas sentia-me completamente desarmada pelo teu encanto de miúdo novo, feliz. estar contigo mostrou-se um perigo, já não era seguro que poderia sair dai como tinha entrado, com o queixo erguido.
- amar é ser vulnerável, sempre ouvi dizer.
- o amor está morto miúdo, há muito. o amor é uma hipérbole usada pelos poetas, o amor é sobrevalorizado, tal como a perfeição. não faz parte de nós. o amor de que tanto falas está sujo, completamente embriagado connosco, faz-nos companhia nestas ruas que pela noite fora se vão entortando. amor...
- porque te custa assim tanto acreditas que me amas?
- porque sobre o amor fizeram-se cântigos antigos, musicas modernas, livros intemporais. mas onde é que o viste? em palavras apenas. isso também vi eu. isso também a perfeição, até essa tem letras. mas o que é real, o que é empírico e possivelmente conhecido? tu não podes conhecer amor, podes crer no amor, como um velho crê na vinda de D. Sebastião. mas nunca poderás vê-lo, tê-lo ou dá-lo. amar não é ser vulnerável, amar é ser fiel a algo que nunca poderás ver ou provar, é como uma religião fanática pelos seu próprios costumes. é fundamentalista. não é saudável.

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