Derrames de olhos que não vêem, lábios que não sorriem

- Não me digas que não tentei ficar lá para vê-la sonhar, porque eu fiquei e esperei por um sorriso todos os dias. E todos os dias eram dias-não, todos os dias eram errados e nada estava na ordem correta para ela sorrir. E eu quis ficar para a ver feliz como da primeira vez, mas eu não consegui, e ela também não.
- Já pensaste que ela podia ter perdido a capacidade de sentir? Quando fui ter com ela a primeira vez, eu contei-lhe a nossa melhor piada, aquela que a fazia rir sem conseguir respirar. Sabes o que ela fez? Nada, ela não sorrir, ela não gritou comigo, ela não me olhou nos olhos sequer. E eu quase que a vi sorrir uma vez quando te via chegar de madrugada, mas ela não conseguia, ela erguia os ombros, os olhos, o queixo, os lábios..., e ainda assim nada. Quando foste embora e eu entrei no vosso apartamento, vazio das tuas coisas, eu sabia o que se tinha passado porque tu me ligaste, ela estava a passar a ferro em frente a televisão. Sabes como ela costuma ficar quando chora, não é preciso mais do que duas lágrimas para tornar aqueles olhos em dois poços de vermelho e inchaço. Sabes o que vi quando ela me olhou e perguntou se jantava? Nada, apenas uns olhos mortos para os outros que não faziam ideia de quem eram. Ela não sabe quem é ou o que quer, e se tu a amas, tu devias e lá e ajudá-la a encontrar o que fosse preciso. 

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