Derrames de cépticos

Toda a dinâmica que envolve a palavra amor sempre foi para mim meio mistério, meio saudade. Toda a vida vivi em redor de tal sonho e mesmo sem saber amar, sei tão bem falar de amor. No fundo de tudo o que acredito há uma grande cota de romantismo, tudo em mim é saudade, tudo em mim é amor. As minhas letras e palavras foram as que me foram mais queridas, as que me faziam acreditar que - talvez - um dia existisse algo tão bom como a minha descrição em prosa de ti. Romântica na teórica e por escrito, reinventei mais de mil crenças e renasci de todas as cinzas dos meus sonhos destruídos nas chamas da raiva que sempre fui.
Na prática, quando me pedem exemplificações físicas, não sou mais do que uma céptica desagradada, envolvida no desamor do mundo e na descrença de palavras como amor. Sou, na prática, o bicho mais sexual e racional, sou aquele que não crê em palavras moles, que não se rege pelos padrões de fantasias à luz das velas.
Dizem-me eles que tudo é uma questão de tempo, que todos os dias chega um dia em que alguém te prova o contrário do que acreditas, todos os dias chega um dia em que alguém te faz estar em harmonia com a terra e o céu, te faz estar bem alto ou bem no meio, e nesse dia a tua fé na raça humana volta, nesse dia tu crês piamente que a palavra amor é afinal de contas a mais bela de todas.
Tretas, digo eu. Depois de tanta viagem da terra ao céu e da terra ao centro desta, eu tenho a mais pura das certezas que o amor existe apenas na forma de letras, sonhos, conselhos. O amor eterno é aquele dos contos de fadas, aquele dos sonhos dos ignorantes, amor é para os vendidos. E o que acontece aos mortais como nós? Resguardados na melancolia de saber a verdade, agarrados à crença de um amor inexistente na prática, agarrados à saudade da ideia dos outros. Deve ser bom dormir descansado, deitar a cabeça no colo de uma almofada e saber que o tempo cura tudo, saber que o amor espera por nós, saber que o amor faz tudo por nós e que o tempo e a distância não são factores que destruam corações.
Deve ser bom ser como tu, crer ainda na eternidade como acreditámos um dia nas cegonhas. Deve ser bom ter a ideia de ir embora sem ter de ir embora, deve ser bom achar que tudo ficara como era e que não haverá nada a alterar com a partida.
Sonho um dia deixar este meu cepticismo de lado e correr para os teus braços em memórias e chegar-me ficar assim, entre o tudo e o nada e acreditar - como tu acreditas no eterno - que estás tão perto, tão ao meu lado, mesmo quando me deito numa cama vazia a pensar em estar em teus braços.

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